Composição: Paula Fernandes e Maurício Santini
De onde é que vem esses olhos tão tristes?
Vem da campina onde o sol se deita
Do regalo de terra que o teu dorso ajeita
E dorme serena, no sereno sonha
De onde é que salta essa voz tão risonha?
Da chuva que teima, mas o céu rejeita
Do mato, do medo, da perda tristonha
Mas, que o sol resgata, arde e deleita
Há uma estrada de pedra que passa na fazenda
É teu destino, é tua senda, onde nascem tuas canções
As tempestades do tempo que marcam tua história
Fogo que queima na memória e acende os corações
Sim, dos teus pés na terra nascem flores
A tua voz macia aplaca as dores
E espalha cores vivas pelo ar
Ah..Ah...Ah...
Sim, dos teus olhos saem cachoeiras
Sete lagoas, mel e brincadeiras
Espumas ondas, águas do teu mar
quarta-feira, 14 de julho de 2010
terça-feira, 20 de abril de 2010
CHUVA COM LEMBRANÇAS, Cecília Meireles
Começam a cair uns pingos de chuva. Tão leves e raros que nem as borboletas ainda perceberam, e continuam a pousar, às tontas, de jasmim em jasmim. As pedras estão muito quentes, e cada gota que cai logo se evapora. Os meninos olham para o céu cinzento, estendem a mão – vão fazer outra coisa. (Como desejariam pular em poças d’água! – Mas a chuva não vem...)
Nas terras secar, tanta gente a esta hora está procurando, também no céu um sinal de chuva! E nas terras inundadas, quanta gente estará suspirando por um raio de sol!
Penso em chuvas de outrora: chuvas matinais, que molham cabelos soltos, que despencam as flores das cercas que entram pelos cadernos escolares e vão apagar a caprichosa caligrafia dos exercícios!
Chuvas de viagens: tempestade na Mantiqueira, quando nem os ponteiros do pára-brisa dão vencimento à água; quando apenas se vê, na noite, a paisagem súbita e fosfórea mostra a pelos relâmpagos.
Catadupas despenhando sobre Veneza misturando o céu e os canais numa água única, e transformando o palácio dos Doges num barco mágico, onde se movem pelos tetos e paredes os deuses do paganismo e os santos cristãos. Chuva da Galiléia, salpicando as ruas pobres de Nazaré, regando os campos virentes, toldando o Lago de Tiberíades, por onde andaram os apóstolos. Chuva pontual sobre os belos campos semeados da França, e na fluida paisagem belga, por onde imensos cavalos sacodem, com displicente orgulho, a dourada crina...
Chuvas antigas, nesta cidade nossa, de eternas enchentes, a de 1811, que com o desabamento de uma parte do Morro do Castelo soterrou várias pessoas, arrastou pontes, destruiu caminhos e causou tal pânico em toda a cidade que durante sete dias as igrejas e capelas estiveram abertas, acesas com os sacerdotes e o povo a pedirem a misericórdia divina. Uma, de 1864, que Vieira Fazenda descreve minuciosamente, com árvores arrancadas, janelas partidas, telhados pelos, ares, desastres no mar, e “vinte mil lampiões de iluminação pública completamente inutilizados”.
Chuvas modernas, sem trovoadas, sem igrejas em prece, mas com as ruas igualmente transformadas em rios, os barracos a escorregarem pelos morros; barreiras, pedras, telheiros a soterrarem pobre gente! Chuvas que interrompem estradas, estragam lavouras, deixam na miséria aqueles que justamente desejariam a boa rega do céu para a fecundidade de seus campos...
Por enquanto, caem apenas algumas gotas aqui e ali, que nem as borboletas percebem. Os meninos esperam em vão pelas poças dágua onde pulariam contentes, tudo é apenas calor e céu cinzento, um céu de pedra onde os sábios e avisados tantas coisas liam, outrora...
“São Jerônimo, Santa Bárbara Virgem, lá no céu está escrito, entre a cruz e a água [benta:] Livrai-nos, Senhor, desta tormenta!”
Nas terras secar, tanta gente a esta hora está procurando, também no céu um sinal de chuva! E nas terras inundadas, quanta gente estará suspirando por um raio de sol!
Penso em chuvas de outrora: chuvas matinais, que molham cabelos soltos, que despencam as flores das cercas que entram pelos cadernos escolares e vão apagar a caprichosa caligrafia dos exercícios!
Chuvas de viagens: tempestade na Mantiqueira, quando nem os ponteiros do pára-brisa dão vencimento à água; quando apenas se vê, na noite, a paisagem súbita e fosfórea mostra a pelos relâmpagos.
Catadupas despenhando sobre Veneza misturando o céu e os canais numa água única, e transformando o palácio dos Doges num barco mágico, onde se movem pelos tetos e paredes os deuses do paganismo e os santos cristãos. Chuva da Galiléia, salpicando as ruas pobres de Nazaré, regando os campos virentes, toldando o Lago de Tiberíades, por onde andaram os apóstolos. Chuva pontual sobre os belos campos semeados da França, e na fluida paisagem belga, por onde imensos cavalos sacodem, com displicente orgulho, a dourada crina...
Chuvas antigas, nesta cidade nossa, de eternas enchentes, a de 1811, que com o desabamento de uma parte do Morro do Castelo soterrou várias pessoas, arrastou pontes, destruiu caminhos e causou tal pânico em toda a cidade que durante sete dias as igrejas e capelas estiveram abertas, acesas com os sacerdotes e o povo a pedirem a misericórdia divina. Uma, de 1864, que Vieira Fazenda descreve minuciosamente, com árvores arrancadas, janelas partidas, telhados pelos, ares, desastres no mar, e “vinte mil lampiões de iluminação pública completamente inutilizados”.
Chuvas modernas, sem trovoadas, sem igrejas em prece, mas com as ruas igualmente transformadas em rios, os barracos a escorregarem pelos morros; barreiras, pedras, telheiros a soterrarem pobre gente! Chuvas que interrompem estradas, estragam lavouras, deixam na miséria aqueles que justamente desejariam a boa rega do céu para a fecundidade de seus campos...
Por enquanto, caem apenas algumas gotas aqui e ali, que nem as borboletas percebem. Os meninos esperam em vão pelas poças dágua onde pulariam contentes, tudo é apenas calor e céu cinzento, um céu de pedra onde os sábios e avisados tantas coisas liam, outrora...
“São Jerônimo, Santa Bárbara Virgem, lá no céu está escrito, entre a cruz e a água [benta:] Livrai-nos, Senhor, desta tormenta!”
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